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29 de Novembro de 2021

Violência sexual: quando os homens são forçados a penetrar

Quando se fala em violação talvez a primeira imagem que surge não seja a de um homem ou rapaz que é forçado a penetrar. No entanto, é necessário reconhecer que a violência sexual abrange um espectro alargado de experiências traumáticas e que ser “forçado a penetrar” também é uma forma de violação.

Esta realidade não é tão reconhecida pelo grande público como outros temas relacionados com violência sexual. Isto deve-se a vários fatores, nomeadamente à desinformação que existe sobre este assunto, mas também devido aos vários mitos e crenças sobre violência sexual.

Forçado a penetrar na infância

Esta forma de violação pode acontecer nas diferentes fases de vida. Durante a infância, o abusador pode coagir duas ou mais crianças a terem contactos sexualizados entre elas, levando, por exemplo, a que um menino penetre uma menina ou outro menino. Para esta criança, a experiência não deixa de ter contornos traumáticos, somente porque foi ela quem penetrou. É errado pensar que, por ter sido levado a ter esse papel, isso reduzirá o impacto traumático.

Todo o abuso é potencialmente traumático para as crianças que passaram por ele. No entanto, por ter sido forçado a penetrar, este menino pode interiorizar que teve um papel participativo e ativo, e, por isso, foi ele o responsável pelo abuso de outra criança. Esta interiorização gera sentimentos de culpa e de vergonha e é um legado bastante cruel, pois não compreende as estratégias de manipulação do abusador que proporcionaram tais contactos, as mesmas estratégias que também garantem o silenciamento das vítimas.

Assim, é comum haver homens sobreviventes cuja intimidade é desencadeadora de mal-estar e de ansiedade disruptiva. São sobreviventes que evitam contactos sexuais por terem receio de ocupar o lugar de abusador/violador pois, desde que foram vítimas de abuso e forçados a penetrar outra criança, associam os atos penetrativos à violência sexual, mesmo quando são consentidos entre duas pessoas adultas. Apesar de não serem abusadores, o medo e a associação errada entre tais atos e o abuso, impede-os de investirem em relações íntimas.

É uma narrativa que é desconstruída com apoio especializado para que depois o homem possa retomar uma vida íntima e sexual saudável e que não seja geradora de mal-estar.

Forçado a penetrar na idade adulta

Sabemos que a maioria dos homens e rapazes sobreviventes são abusados por outros homens, mas também há mulheres que abusam, existindo contornos de género que têm de ser considerados. Nestes casos, os estereótipos associados aos papéis de género reforçam ideias erradas e contribuem para o silenciamento dos homens vitimados. A crença de que as mulheres são mais fracas e, por essa razão, ser forçado a penetrar não é de todo possível, ou o mito de que os homens estão sempre disponíveis para sexo e que cada oportunidade para ter sexo com uma mulher é uma “benção”, estão na génese da invisibilização desta forma de violação, até entre as próprias vítimas.

Num estudo realizado por Siobhan Weare, umas das estratégias mais comuns usadas pelas mulheres que abusaram foi o recurso à chantagem e ameaças (22%). Ou seja, disseminar mentiras sobre o homem, ameaçar terminar com a relação ou ameaçar espalhar rumores sobre o homem e pressioná-lo verbalmente após ter dito que não, foram algumas das formas identificadas para forçar a penetrar. 14,4% dos homens referiu ainda ter havido recurso à força, nomeadamente usar o peso do próprio corpo para aprisioná-lo, prender os braços dele ou mesmo usar uma arma. Contrariamente a algumas expectativas, o recurso ao consumo não consentido de substâncias psicoativas foi identificado apenas por dois dos 154 participantes.

Ser “forçado a penetrar” é uma forma de violência sexual, mas para muitas pessoas, e até vítimas, pode não ser reconhecida como tal. Se experienciou esta ou outra forma de abuso, queremos que saiba que não está sozinho. Pode contar com o nosso apoio. Contacte-nos através do email apoio@quebrarosilencio.pt ou da nossa Linha de Apoio 910 846 589

Os nossos serviços de apoio são confidenciais e gratuitos.