Saiu hoje no Público uma entrevista a Catarina Ribeiro, psicóloga do Instituto de Medicina Legal, sobre a forma como as crenças, mitos e preconceitos influenciam as deliberações dos processos de abuso sexual, nomeadamente nos casos de abuso intrafamiliar.
Crenças e mitos
Numa entrevista que consideramos directa e esclarecedora, a psicóloga Catarina Ribeiro refere que há casos nos quais os juízes, se tivessem oportunidade, não recorreriam a pedir perícias. “Eu mal vejo uma criança a entrar percebo o que ela está a sentir porque sou muito intuitiva.”
Este tipo de comportamento é, como diz no artigo, problemático e pode afectar negativamente o resultado do caso, como pode passar a mensagem de que o sistema não acredita na criança. É fundamental ter uma base e um sistema que apoie as vítimas e onde as crianças vítimas de abuso sexual sintam que são tratadas com respeito, que são ouvidas e que quem lida com as crianças acredita nas suas palavras.
Acreditar nas crianças
Quando sabemos que “80 a 90% dos casos de abusos sexuais na Europa dependem da prova testemunhal”, ouvir um magistrado referir que “as crianças vêm muitos filmes e têm muitas fantasias e portanto não podemos acreditar na maior parte do que elas dizem” é preocupante, quando pensamos no desfecho do caso e na protecção e no bem-estar da criança.
Mas não são só alguns magistrados com estas ideias. Um estudo feito em Espanha mostrou que cerca de 50% dos pais e professores acreditavam que muitas crianças inventam histórias de abuso sexual e que as inventam para se vingar dos adultos.
Estamos perante um conjunto de pessoas que pode correr o risco de ignorar a seriedade dos casos em que se tem conhecimento que uma criança foi vítima de abuso sexual. Em Fevereiro de 2016, um homem de 71 anos foi condenado a dois anos e três meses de prisão com pena suspensa. Esse mesmo indivíduo já tinha sido condenado a outra pena suspensa por tentar abusar sexualmente de uma neta. No caso do neto, o tribunal considerou que o avô masturbar o neto apresentava “gravidade situada no plano médio inferior atentas as práticas passíveis de serem enquadradas nesta incriminação”.
Mitos e crenças
Os mitos e crenças sobre o abuso sexual são obstáculos que dificultam o sucesso do processo terapêutico e que também podem complicar um processo judicial. Este mitos não são exclusivos às vítimas de abuso sexual, são ideias e preconceitos partilhados em geral e que afectam a percepção de como se lida com estas questões. Muitas vezes, estes mitos estão tão enraizados no tecido social que os homens vítimas de abuso sexual passam a acreditar internamente nesses mitos, o que dificulta o acesso à ajuda e a ultrapassar o trauma.
Saiba mais sobre os mitos relativos ao abuso sexual na nossa página https://quebrarosilencio.pt/mitos.