Novas masculinidades


Um dos principais obstáculos para os homens vítimas/sobreviventes procurarem apoio prende-se com os atributos associados à masculinidade tradicional. Mas que masculinidade é esta? Que valores e expectativas estão na base do que se espera dos homens?

“É na vulnerabilidade que vejo e ganho a minha força”

A violência e abuso sexual continuam a ser um assunto tabu com graves consequências para os/as sobreviventes, tornando-se especialmente complexo para os sobreviventes masculinos. Ser sobrevivente homem de abuso sexual pode desafiar o próprio estereótipo masculino de que os homens são capazes de se proteger a si mesmos, e isso pode representar um obstáculo para os sobreviventes exprimirem a sua vulnerabilidade ou procurarem apoio (Badenoch. 2015).

A vulnerabilidade é muitas vezes vista como algo negativo, a evitar, e por vezes antónimo de masculinidade. Porém, a vulnerabilidade faz parte da condição humana, seja homem ou mulher. Um dos sobreviventes que procurou apoio na Quebrar o Silêncio proferiu o seguinte: “é na vulnerabilidade que vejo e ganho a minha força”. É esta a visão que valorizamos. E nesse sentido, procuramos criar condições onde um homem se sinta seguro para exprimir os seus sentimentos sem que isso se traduza em algo negativo ou fonte de mal-estar.

Valores tradicionais associados à masculinidade

Num estudo, com cerca de vinte mil participantes sobre os atributos associados à masculinidade, concluiu-se que os homens acreditam que a autoconfiança e auto-suficiência são qualidades biológicas e fundamentais para o sucesso evolucionário da espécie humana. Porém, quando esses atributos são levados ao extremo podem tornar-se num obstáculo para um homem pedir apoio numa altura difícil ou de crise. A procura de serviços de apoio pode representar, por exemplo, a castração da virilidade e nessas situações concluiu-se que sofrer em silêncio é a única opção aceitável.

Os homens partem do princípio que vão ser vistos com desconsideração ao desviarem-se destes padrões comportamentais. “Há uma distância entre o que os homens entendem que os outros homens acreditam ou fazem e aquilo que os homens realmente acreditam e fazem”. Quando um homem foge a essas normas acredita que vai passar a ser visto como menos viril ou masculino. “A ironia é que muitos desses homens pensam dessa forma e por isso têm receio de fugir delas, mas acabam por perpetuá-las também”, refere Joel Wong, coordenador do estudo “Meta-Analyses of the Relationship Between Conformity to Masculine Norms and Mental Health-Related Outcomes” de 2016.

Novas masculinidades

De uma forma geral, os homens sentem-se menos à vontade para falar do abuso sexual do que as sobreviventes mulheres (Holmes et al. 1997). O silêncio e falta de diálogo sobre o que os homens realmente pensam e o conflito entre o que acreditam que devem fazer é grande e nocivo para o bem-estar mental e psicológico (Wong. 2016).

Nós acreditamos que um homem pode mostrar vulnerabilidade sem que isso afecte negativamente a sua masculinidade e bem-estar. Acreditamos também que um homem pode partilhar as suas emoções e sentimentos sem que isso represente uma agressão ou simbolize uma forma de castração. A Quebrar o Silêncio promove valores para uma sociedade equitativa onde mulheres e homens possam desfrutar de uma igualdade de género que beneficie todos e todas.

Os novos valores de masculinidade devem de ser livres das amarras que acorrentaram e solidificaram os valores tradicionais, compreendendo que esses mesmos valores não representam hoje a única forma de expressão da masculinidade.