João – 35 anos


“Já passou.”, “Foi só uma vez, há coisas piores.”, “Ninguém precisa de saber o que aconteceu.”, “Isto já foi há imenso tempo, não tem qualquer impacto em mim.” Esta era a forma como eu lidava com o que me tinha acontecido. Mas, mais fundo existiam outras frases que me assombravam: “És fraco”, “Não és um homem”, “Podias ter feito alguma coisa e não fizeste.”, “Eu sou o culpado de tudo.” Eram estas as frases mais profundas que corroíam todo o meu ser. Que me faziam viver com todo um sentimento de desvalorização, baixa autoestima, medos e inseguranças. Como estava tão enganado ao pensar que aquele episódio de abuso sexual que juntou uma criança e um pré-adolescente não tinha tido qualquer impacto em mim.

Mas questionei: “E se tiver impacto?”, “Porque é que penso todas estas coisas negativas sobre mim?” E dar o primeiro passo para pedir ajuda não foi nada fácil. Todo o meu corpo tremia, mas foi uma das melhores decisões que tomei até hoje. Ao começar a receber o apoio da associação Quebrar o Silêncio senti-me como nunca me tinha sentido: senti-me ouvido, respeitado e compreendido. É como receber todo um carinho que faltava em mim e que me permitiu começar um processo de compreensão dos impactos que foram deixados pelo abuso sexual. Foi um passar de “não querer” pedir ajuda para ansiar pela próxima sessão.

Hoje já consigo olhar para mim com outros olhos. Consigo não sentir-me culpado com o que me aconteceu. Sinto que o episódio do abuso sexual perdeu a sua força sobre mim. Não me define nem diz quem eu sou. Tudo isto permite-me seguir um caminho mais leve, com um outro olhar sobre mim e isso traz-me liberdade e leveza.