2 anos de Quebrar o Silêncio por Ângelo Fernandes


Dois anos de Quebrar o Silêncio representam dois anos de trabalho árduo e pioneiro que passam por desbravar um território desconhecido para a maioria das pessoas. Poderia até descrever esta viagem como uma navegação por um campo de minas, na qual cada passo tem de ser cuidadosamente pensado antes de progredirmos. Isto porque existem muitas barreiras, mitos, crenças e estereótipos que estão enraizados na sociedade. São obstáculos que precisam de ser desconstruídos com igual cuidado para que, cada vez mais, seja reconhecido e aceite que os homens e rapazes também são vítimas de violência sexual.

Nos dois primeiros anos de atividade, a Quebrar o Silêncio registou um total de 247 pedidos de apoio, dos quais 146 foram homens.

Nos dois primeiros anos de atividade, a Quebrar o Silêncio registou um total de 247 pedidos de apoio, dos quais 146 foram homens. 146 homens sobreviventes de violência sexual que viram na Quebrar o Silêncio um porto de abrigo, um lugar seguro onde puderam finalmente falar sobre as suas histórias de abuso e contar com um apoio especializado. São homens que, na sua maioria, falam do abuso de que foram vítimas pela primeira vez e que, na grande maioria, é também a primeira vez que procuram apoio. E porque estes homens não vivem isolados numa ilha longínqua, convém relembrar que são os nossos pais, filhos, avôs, colegas e amigos. São sobreviventes que durante anos e décadas carregaram em silêncio um segredo devastador, sem nunca terem tido oportunidade de partilhar a sua história.

Em 2018, 18 sobreviventes deixaram de necessitar os nossos serviços. 18 homens cujas vidas não são mais afetadas pelo trauma.

É com grande orgulho e um sentimento de vitória que vemos estes homens a reconhecerem em nós, na Quebrar o Silêncio, a resposta para ultrapassar as consequências que o abuso teve nas suas vidas. E se no primeiro ano de atividade vimos vários homens sobreviventes a procurar o nosso apoio, no segundo ano vimos os primeiros homens a terminar o seu processo. Em 2018, 18 sobreviventes deixaram de necessitar os nossos serviços. 18 homens cujas vidas não são mais afetadas pelo trauma.

Foi com este objetivo que fundei a Quebrar o Silêncio, para que os homens sobreviventes de violência sexual tenham o apoio que necessitam e merecem; para que os homens que permanecem silenciados, questionando-se se podem ou não quebrar o seu silêncio, a sofrer em silêncio, saibam que não estão sozinhos e que podem contar com o nosso apoio. É fundamental que estes homens, e a sociedade, saibam que não há nada de errado com eles, que o seu caso não foi único ou que são a excepção à regra.

São dois anos de um extenso trabalho, mas que está longe de terminar. Vamos continuar a trabalhar para aumentar a visibilidade desta causa, informar e educar para esta realidade, de modo a construirmos um contexto social que reconheça e respeite estes homens.

No combate contra a endemia que é a violência sexual, é fundamental que nenhuma vítima/sobrevivente fique sem apoio – seja homem ou mulher.

Ângelo Fernandes,
Fundador da Quebrar o Silêncio